Tive bens danificados pela chuva posso processar o Município?

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Infelizmente é comum, todos os anos se repetem as mesmas cenas de ruas e até bairros ou cidades inteira alagadas devido às fortes chuvas que caem, principalmente durante o verão.

Tais fatos acabam por causar diversos prejuízos materiais aos cidadãos, seja por danos à seus veículos estacionados na rua, seja por danos em seus bens pessoais devido à alagamento do interior de suas residências.

Mas será que podemos processar o Estado, para obter alguma indenização pelos danos sofridos?

É de responsabilidade dos Municípios fornecer, organizar e prestar diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, os serviços públicos essências de interesse local, como é o caso do sistema de escoamento das águas pluviais, conforme art. 30, V, da Constituição Federal.

A discussão se resume ao fato de haver ou não, culpa do Estado na deficiência do sistema de drenagem das cidades, para suportar chuvas muitas vezes em nível comum e totalmente previsível.

E se o fato de chover acima do normal ou, ainda, se o entupimento de bueiros e do sistema de drenagem é culpa das pessoas que depositam lixos nas ruas, configura culpa de terceiros, excluindo a responsabilidade do Estado.

A responsabilidade abarca tanto o dano material sofrido, com a perda de bens de valor, quanto o dano moral pela sofrimento e aflição causados.

Passamos então, a análise de como os Tribunais tratam o tema:

Responsabilidade do Município

A chave para que se haja a responsabilidade do Estado é provar que não foram tomadas as medidas necessárias com construção, limpeza e manutenção de bueiros e galerias para coleta de águas pluviais.

Geralmente tal prova é feita através de um laudo técnico, ou perícia, com análise prévia ou posterior do sistema de escoamento de águas.

Tal prova é essencial, pois configurará a omissão do Município, sendo que a responsabilidade do Estado nestes caos, é tida como subjetiva, fugindo a regra que é a responsabilidade objetiva, pela natureza da omissão, a qual não se pode presumir, conforme precedentes do STF.

Ou seja, tem que se provar a omissão para haver o nexo entre a omissão do município e a inundação que causou o dano.

Passamos então, à analise de precedentes dos Tribunais, que concluíram pela responsabilidade do Estado:

O Tribunal de Justiça do Sergipe já entendeu ter havido responsabilidade do Município, mesmo que o serviço de escoamento de aguas seja prestado por empresa privada ou por outro órgão descentralizado. Sob a justificativa de haver provas da omissão na manutenção do sistema de escoamento das águas pluviais, e que caso obras de desobstrução houvessem sido realizadas a tempo, não haveria a enchente causadora do dano. (TJ/SE – Apelação nº. 00102578720188250000);

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo também já entendeu ter havido responsabilidade de Município, o qual em conjunto com o Departamento de Aguas e Energia do Estado (DAEE), não tomaram medidas de manutenção nos dispositivos de captação de água pluvial, limpeza de galerias, desassoreamento, etc…, conforme um laudo técnico constante do processo (TJ/SP Apelação nº. 00046439120118260106);

Em mais um precedente, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, entendeu não haver responsabilidade do Município, havendo apenas responsabilidade do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), por atrasos em obras no sistema de escoamento de águas, prometidas por representante de tal órgão, numa ata de assembleia do condomínio afetado, o que teria sido causa do alagamento. (TJ/SP, Apelação nº. 30235289820138260602);

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul também já entendeu ter havido responsabilidade do Município, configurando-se omissão na manutenção dos dispositivos de escoamento de águas pluviais. (TJ/RS – Apelação nº. 70077756146);

Em mais um julgado o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, se concluiu pela responsabilidade do Município por ter realizado obras em galerias para coletar águas pluviais, as quais, após sua conclusão, passaram a causar alagamento em uma residência, numa região onde antes não haviam alagamentos. (TJ/RS, Recurso Cível nº 71006761043).

Não responsabilidade do Município

Quando não se consegue fazer prova da existência de omissão do Estado, em relação a omissões no sistema de coleta das águas pluviais, ou nos casos em que mesmo havendo tal prova, o volume de água das chuvas se mostrou extraordinário, muito maior do que a média para o período, tem se entendido pela existência força maior, o que exclui a responsabilidade do Estado.

Passamos à analise dos precedentes que concluíram pela inexistência de responsabilidade do Estado:

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul entendeu não haver responsabilidade, se não restou comprovado pelo Autor da ação, de que a inundação do imóvel decorreu do despreparo do sistema urbano de drenagem de águas. (TJ/RS, Apelação nº. 70078041852 e Apelação nº. 70078318656)

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendendo que a omissão do Município não pode ser presumida, e não restou provada, concluir por inexistir responsabilidade do Município por danos causados pela chuva. (TJ/SP, Apelação nº. 10062094120168260637);

O Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso entendeu que não há responsabilidade do Município, se existe sistema de coleta de águas pluviais, mas ouve agravamento pelos bueiros estarem entupidos por atos de terceiro, o que excluiria a responsabilidade do Município. (TJ/MT, Apelação nº. 000247291201481100041367162016);

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendeu não haver responsabilidade, pela existência de sistema de coleta de águas pluviais, sendo que a inundação se deu devido a caso fortuito, pelo fato da chuva ser extraordinariamente forte, chovendo em três horas de um dia, o equivalente a duas vezes a média do mês inteiro. (TJ/SP, Apelação nº. 00070086520078260072).

Problemas na construção do imóvel

Ainda, nos casos onde o alagamento se da por existir problemas no projeto ou na construção do imóvel, e não por problemas no sistema de drenagem pública, há responsabilidade da construtora pelos danos decorridos de tais alagamentos, conforme precedente do Tribuna de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS – Recurso Cível: 71007324478).

CONCLUSÃO

A questão principal para que haja a responsabilização do Poder Público, no caso o Município por danos decorrentes de alagamentos e enchentes é comprovar que houve omissão no oferecimento e manutenção do sistema de drenagens de águas pluviais, com perícia indispensável, e embora seja uma prova técnica e muito custosa, é uma prova possível.

Mas também pode ser comprovado por reclamações encaminhadas à Prefeitura e promessas de obras feitas pelo Poder Público que não foram realizadas a tempo.

Ressalvados os casos, em que a falha no sistema de drenagem se dá por fato ou obra de terceiros, e nos casos de chuva em quantidade muito maior que a média do período, em que não há como responsabilizar o Município pelos danos sofridos, devido a tratar-se de caso fortuito.

E por fim, caso o alagamentos se deem por falhas no projeto e construção do imóvel, a construtora pode ser responsabilizada pelos danos sofridos.

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Texto escrito pelo Dr. Diego dos Santos Zuza, advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados.

Art. 30, V, Constituição Federal

https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/91972/constituicao-da-republica-federativa-do-brasil-1988#art-30_inc-V

TJ-SE – APL: 00102578720188250000

https://tj-se.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/682190266/apelacao-remessa-necessaria-apl-102578720188250000/inteiro-teor-682190271?ref=juris-tabs

TJ-SP Apelação nº. 00046439120118260106 SP

https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/535964007/46439120118260106-sp-0004643-9120118260106?ref=serp

TJ/SP, Apelação nº. 30235289820138260602

https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/478282034/apelacao-apl-30235289820138260602-sp-3023528-9820138260602?ref=serp

TJ/RS – Apelação nº. 70077756146

https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/665971888/apelacao-civel-ac-70077756146-rs?ref=serp

TJ/RS, Recurso Cível nº 71006761043

https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/620253583/recurso-civel-71006761043-rs?ref=serp

TJ/RS, Apelação nº. 70078041852

https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/623435669/apelacao-civel-ac-70078041852-rs?ref=serp

T/RS Apelação nº. 70078318656

https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/622012450/apelacao-civel-ac-70078318656-rs?ref=serp

TJ/SP Apelação nº. 10062094120168260637

https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/578902969/10062094120168260637-sp-1006209-4120168260637?ref=serp

TJ/MT Apelação nº. 000247291201481100041367162016

https://tj-mt.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/628018498/apelacao-apl-247291201481100041367162016-mt/inteiro-teor-628018520?ref=juris-tabs

TJ/SP, Apelação nº. 00070086520078260072

https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/574640516/70086520078260072-sp-0007008-6520078260072?ref=serp

TJ-RS – Recurso Cível: 71007324478

https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/550554484/recurso-civel-71007324478-rs?ref=serp